O dia parecia interminável! Os ponteiros moviam-se preguiçosamente... segundos, minutos, horas. Da janela do escritório, dava para perceber o entardecer. Quinze para as seis horas da tarde! Que dia interminável! Cris respira fundo, uma, duas, tres vezes. Pensa que ao chegar em casa, a roupa que ficara na máquina a esperava para ser pendurada no diminuto varal de seu micro apartamento. Sem falar na louça que ficara na pia, para ser lavada.
Passa as mãos puxando a franja, que teima em cair sobre seus olhos. Já pensara quinhentas vezes em cortar o cabelo bem curto, só para se livrar deste movimento automático, que já se tornara um cacoete. O perfume adocicado e enjoativo de sua colega, invade suas narinas. Será que ela não poderia usar menos perfume? Isso era todos, entenda bem, todos os dias. Não dava para definir se era daquela marca vendida de porta em porta , e que era indistintamente de cheiro enjoativo.
Abre a bolsa que está sobre sua mesa e tira dela o chanel número cinco, comprado de uma colega que traz muamba de Rivera! Dá um spray rápido nas mãos e as coloca em concha no nariz. Cheira profundamente, como se aspirasse uma droga... alívio imediato. Dez para as seis horas da tarde. Olha com o canto do olho para o corredor da entrada da sala onde fica o relógio ponto. Dois colegas lá estão de prontidão para marcarem seu cartão . São os mesmos colegas de ontem e de anteontem e de todos os outros dias anteriores à hoje. Apressadinhos, hã!
Meu deus, dez anos em um emprego que logo ao entrar, percebera ser uma fria. Um riso incontrolável sacode o corpo de Cris. Lembra quando entrara na repartição e fôra recebida por Seu Luiz, com o cabelo e o bigode pintados. Ele ainda não se aposentara. Semana passada passou a lista para fazer uma vaquinha - presente(dera quinze reais) por ser o funcionário mais antigo do escritório! Ela dissera na época quando da entrada, para si mesma... será por pouco tempo, só até arranjar algo melhor. E lá se foram dez anos de sua vida. Um suspiro-gemido saiu de sua boca, fazendo um som que chamou a atenção dos outros funcionários e que ela prontamente disfarçou ser um bocejo!
Cinco minutos para as seis horas da tarde. Como em um ritual, pega a bolsa, coloca dentro dela o celular, antes espiando para ver se ele ligara, nada registrado. Sacode os ombros, tanto faz, sempre ela é quem liga para ele. Pega os lencinhos de papel sobre a mesa. Por instantes sua mente se distrai com as borboletas coloridas desenhadas neles, tão bonitinhas!
Dois minutos... deu! Acabou! Por hoje chega!
Lembra das palavras da vidente que consultara, indicada por uma colega, na semana passada...
- O mundo vai acabar este ano, e tu não vai fazer nada para mudar ao menos um pouco tua vida?
Resignada, suspira novamente, enquanto levanta, coloca a cadeira no lugar, desliga o computador e carrega o corpo até o relógio ponto. Tem colegas á sua frente. Resignada escuta os planos de irem tomar uma cerveja na lancheria da esquina.
Quando bate o ponto, o cartão mostra seis horas e sete minutos...
- droga, que inferno, a empresa me deve sete minutos.
Entra no elevador, alguém aperta o botão térreo. A ascensorista, mais rápida que ela já havia batido o ponto, com toda a certeza as seis horas em ponto! Com raiva de si mesma, por ter perdido sete malditos minutos em sua vida, Cris vai para casa.
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